Nova configuração servirá de base para políticas públicas federais na área de alimentação
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva assina nesta terça-feira um decreto para instituir uma cesta básica de alimentos saudáveis no país. Outro decreto, firmado também nesta terça, instituirá o Programa Cozinha Solidária, que destinará R$ 30 milhões do orçamento do Ministério do Desenvolvimento Social (MDS) para apoiar projetos da sociedade civil de distribuição de alimentos para pessoas em vulnerabilidade.
A nova cesta definirá diretrizes para políticas públicas do governo. Ou seja, com base na regulamentação, o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) ou o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) podem decidir comprar apenas itens previstos no decreto, explica a secretária nacional de Segurança Alimentar e Nutricional do MDS, Lilian Rahal.
“A ideia é que a gente tenha uma orientação para ampliar o acesso da população em geral à alimentação saudável, especialmente dos mais pobres”, afirma Rahal, em entrevista ao Valor. “Várias pesquisas internacionais têm tratado do impacto dos ultraprocessados e das bebidas açucaradas, o quanto isso é danoso para a saúde e o quanto isso causa de morte. Nós queremos que os nossos programas tenham as diretrizes da nova cesta básica para avançar rumo à alimentação saudável.”
Após a assinatura do decreto, o governo publicará em portaria uma lista com exemplos de alimentos. O documento incluirá dez grupos, levando em conta critérios como a produção regional a sociobiodiversidade e a recomendação em guias oficiais que trazem os alimentos saudáveis já consumidos pela população, segundo a Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF), publicada pelo IBGE em 2020.
A nova cesta não substituirá a cesta básica criada em decreto no governo Getúlio Vargas, em 1938, que serve como base para a composição do salário-mínimo e a tributação sobre alimentos. Mas, ao incorporar princípios de alimentação saudável e hábitos regionais, poderá ter reflexos na regulamentação da reforma tributária no Congresso neste ano, ao dispor sobre a taxação desses alimentos.
Em seu artigo 8º, a reforma tributária estipulou a criação da Cesta Básica Nacional de Alimentos. De acordo com o dispositivo, essa cesta “considerará a diversidade regional e cultural da alimentação do país e garantirá a alimentação saudável e nutricionalmente adequada” à população. Uma lei complementar definirá os produtos que comporão essa cesta e quais serão isentos de tributos.
O 2º Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil (II Vigisan), com dados referentes ao período de novembro de 2021 e abril de 2022, mostra que 33 milhões de brasileiros passam fome em um universo de cerca de 125 milhões que vivem sob algum grau de segurança alimentar.
“Quando a gente fala em segurança alimentar leve, quer dizer que as pessoas às vezes têm acessos à comida, só que teoricamente não é de qualidade. Nesse novo ciclo de políticas públicas que o governo vem tentando fazer, a ideia é acabar com a fome com comida de verdade”, diz Gisele Bortolini, coordenadora-geral de Promoção da Alimentação Adequada e Saudável do MDS. “A gente está definindo pela primeira vez em decreto presidencial o que é uma alimentação saudável.” Segundo ela, consumir alimentos ultraprocessados ou in natura “é uma escolha individual”. “Você vai tomar essa decisão com autonomia, mas é preciso uma série de políticas para que esse alimento esteja perto de você”, diz.
O segundo decreto a ser assinado por Lula nesta terça cria um programa para auxiliar a sociedade civil que se mobiliza nas chamadas Cozinhas Solidárias. O governo dispõe de R$ 30 milhões que serão retirados do orçamento do MDS para o programa e espera credenciar de 300 a 400 projetos de Cozinha Solidária, de um total de 2.400 mapeadas em todo o país. O MDS prepara um edital para credenciar entidades da sociedade civil que trabalhem com essas cozinhas e farão a elas o repasse das verbas. “A ideia é repassar pelo Mrosc [Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil] para as entidades, que vão repassar para cozinhas para custearem despesas diversas. Alimento, gás, energia, utensílios”, afirma Rahal.
O Brasil deixou o Mapa da Fome da FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura) em 2014, mas retornou em 2022, com os impactos da pandemia e, segundo integrantes do governo petista, do “desmonte das políticas sociais”.
O país assumiu o compromisso de erradicar a fome novamente até o fim da década na Agenda 2030, que traz os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável no âmbito da ONU. Um dos objetivos de Lula, dizem auxiliares, é antecipar esse prazo.
Fonte: Valor Econômico