Em Destaque · 10 outubro 2022

Comércio tem leve queda de 0,1%, no terceiro mês seguido de desempenho negativo

As vendas do comércio brasileiro dão sinais gerais de estagnação, conforme mostram os dados da Pesquisa Mensal de Comércio (PMC), divulgados nesta sexta-feira pelo IBGE. O volume de vendas do setor recuou 0,1% em agosto.

Apesar do volume de vendas estar 1,1% acima do pré-pandemia, o resultado de agosto posiciona o comércio no menor patamar do ano de 2022, de acordo com o gerente da pesquisa, Cristiano Santos.

As vendas de hipermercados subiram ligeiramente 0,2% em agosto, em relação ao mês anterior, quando recuaram 0,7%. Ao mesmo tempo, a venda de produtos farmacêuticos caiu 0,3%. Segundo Santos, o desempenho desses dois setores funcionaram como espécie de âncora para o resultado geral.

— Ficou muito clara a participação da atividade de hiper e supermercados como fator âncora, segurando a variação muito próxima ao zero. A atividade pesa cerca de 50% no índice global. Artigos farmacêuticos também contribuiu em termos de peso para essa ancoragem — explica o pesquisador.

Andando de lado

Economistas avaliam que o comércio varejista pode se beneficiar da Copa do Mundo, que acontece no Catar a partir de novembro. Segundo a Confederação Nacional do Comércio (CNC), a Copa do Mundo de 2022 deve movimentar R$ 1,48 bilhões no varejo brasileiro. A melhora do mercado de trabalho em conjunto com estímulos fiscais do governo, como o aumento do Auxílio Brasil que começou a ser pago em agosto, também ajudam no desempenho nos próximos meses.

Mas a expectativa de é de um otimismo moderado até o fim do ano. Isso porque o nível de endividamento das famílias está elevado em meio a uma taxa de juros em 13,75% ao ano reduz a demanda pelos bens mais sensíveis ao crédito.

Segundo Rodolfo Margato, economista da XP, a demanda pelos bens mais sensíveis ao crédito deve permanecer em tendência de queda. Mas a recuperação do mercado de trabalho e os estímulos fiscais de curto prazo devem suavizar a desaceleração esperada para o varejo, dando alguma sustentação à demanda pelos bens mais sensíveis à renda.

“Prevemos virtual estagnação para o varejo ampliado [que inclui vendas de veículos e materiais de construção] nos próximos meses”, pontuou Margato, em nota.

Lucas Maynard, economista do Santander, destacou em relatório que os números de agosto fornecem mais evidências da contínua deterioração da atividade do varejo no terceiro trimestre.

“Esperamos que a atividade apresente um desempenho fraco no segundo semestre, em meio a um achatamento da massa salarial real, desaceleração na concessão de crédito às famílias e normalização da taxa de poupança”, disse.

Alejandro Ortiz, analista da Guide Investimentos, prevê alta em torno de 1% para o varejo ao final de 2022, o que é considerado um crescimento pífio pelos analistas econômicos tendo em vista o histórico do setor:

— Em essência os estímulos fiscais, como o Auxílio Brasil, estão adiando o efeito do aperto monetário. Mas isso de certa forma é um crescimento artificial.

Inflação pesa sobre o setor

A pesquisa revela que o patamar de preços praticados ao consumidor brasileiro tem influenciado de forma significativa o desempenho do setor varejista.

Se de um lado o volume de vendas de combustíveis e lubrificantes cresceu 3,6% em agosto – um reflexo da redução dos impostos que impulsionou a demanda -, do outro, há atividades que lidam com o aumento dos preços e impactam o volume de vendas ao longo do ano.

— Ainda existem pressões inflacionárias em outras atividades. E no caso do comércio, em que o peso de supermercados é muito forte, a inflação que vem dos alimentos e bebidas também contribui no sentido de reduzir o poder de compra e o ímpeto das pessoas ao consumo — conclui Santos.

Veja calendário: Um dia depois de confirmado o segundo turno, governo antecipa pagamento do Auxílio Brasil
Alejandro Ortiz, da Guide, concorda com Santos. Ele afirma que a elevada inflação de alimentos desde o ano passado tem pesado sobre o setor de supermercados, o que acaba batendo na renda disponível das famílias que acabam não conseguindo comprar o suficiente de alimentos.

— E isso já tem sim uma correlação com a produção [de alimentos] na indústria — lembra Ortiz. Na quarta-feira, o IBGE mostrou que a produção industrial caiu 0,6% em agosto, com retração de 2,6% de produtos alimentícios em itens básicos como leite, açúcar e carnes.

O setor de vestuário e calçados, por exemplo, avançou 13% em agosto, mas ainda não se recuperou do patamar pré-pandemia e devolveu parte das quedas também de dois dígitos registrados nos dois meses anteriores. O mesmo ocorre com as atividades de papelaria (2,1%), móveis e eletrodomésticos (1,0%), que estavam em queda no mês de julho e ainda não se recuperaram totalmente dos efeitos da crise sanitária.

Segundo o IBGE, a alta dos preços sobretudo em itens de mobiliário, eletrodomésticos e equipamentos, vestuário, automóvel novo e produtos farmacêuticos impactam o desempenho do varejo. No campo negativo, as vendas de equipamentos e material para escritório caíram 1,4% em agosto, enquanto artigos de uso pessoal recuaram 1,2% e artigos farmacêuticos cederam 0,3%.

No comércio varejista ampliado, que inclui as atividades de veículos, motos, partes e peças e de material de construção, o volume de vendas caiu 0,6% frente a julho.

Perspectivas

O Índice de Confiança do Comércio (ICOM) do FGV IBRE subiu 2,4 pontos em setembro, ao passar de 99,4 para 101,8 pontos. Segundo Rodolpho Tobler, economista do FGV IBRE, essa melhora está relacionada com a recuperação da confiança do consumidor nos últimos meses, do mercado de trabalho, desaceleração da inflação, além de algumas medidas de estímulos do governo.

— A continuidade dessa trajetória positiva ainda é incerta no médio-longo prazo porque depende também da continuidade de melhora do ambiente macroeconômico — pondera Tobler.

Fonte: O Globo