Imposto sobre Valor Agregado (IVA) com alíquota de 25% pode fazer preços dos alimentos dispararem, afirma João Galassi, presidente da Abras
Prioridade do Ministério da Fazenda no primeiro semestre, a reforma tributária que está em discussão no governo, que prevê um imposto único, penalizará setores cruciais da economia brasileira e pode fazer os preços dos alimentos dispararem, prejudicando os consumidores em todo o país.
A avaliação é do presidente da Associação Brasileira de Supermercados (Abras), João Galassi, que alerta para o aumento da carga tributária e afirma que o Executivo deveria fazer a sua parte, cortando despesas, em vez de onerar segmentos como o comércio, os serviços e o agronegócio, que hoje pagam alíquotas mais baixas.
Em entrevista ao Metrópoles, Galassi critica a ideia de se criar um único tributo, o Imposto sobre Valor Agregado (IVA), com uma alíquota de 25%, em substituição a diversos tributos federais, estaduais e municipais que incidem sobre bens e serviços, como ICMS, IPI, ISS, PIS e Cofins. Este é o princípio do projeto de reforma tributária em estágio mais avançado no Congresso Nacional, a PEC 45/2019, cujo autor é o atual secretário extraordinário da reforma tributária, Bernard Appy.
“De quanto seria o aumento na sardinha com a proposta que está sendo discutida, de um IVA de 25%? A sardinha teria um aumento de 18%. De quanto seria o aumento do azeite? 7%. De quanto seria o aumento nos ovos de Páscoa? O impacto seria ainda maior porque o ovo de Páscoa é composto de leite, de cacau, de açúcar… Todos esses itens teriam um aumento de, no mínimo, 18%”, estima Galassi.
“O Estado não teria inúmeras possibilidades de redução de custos? Eu acho que tem. A reforma tributária, como está sendo proposta, com uma alíquota única, é totalmente inviável. Não dá nem para iniciar uma conversa falando em IVA de 25%”, critica o presidente da Abras.
Na entrevista, Galassi fala também sobre a transformação dos supermercados brasileiros durante a pandemia de Covid-19, o investimento em novas lojas e o aumento do consumo nos lares brasileiros neste início de ano, entre outros temas.
Leia os principais trechos da entrevista concedida por João Galassi ao Metrópoles:
O setor de supermercados foi o que mais gerou empregos no país entre 2020 e 2021, no auge da pandemia. Como foi enfrentar esse período?
Foi um grande desafio para todos nós, tanto para a sociedade quanto para o setor. Nós atendemos os consumidores com a cara e a coragem em um momento no qual ninguém sabia direito o que estávamos enfrentando. Tivemos de desenvolver rapidamente novos padrões operacionais para que pudéssemos dar tranquilidade e proteção aos nossos colaboradores e consumidores. Esses padrões se tornaram tão eficientes que serviram de exemplo para que outros setores, à medida que foram voltando ao dia a dia da operação, estivessem preparados como nós. Naquele momento, tivemos um grande desafio também na digitalização. Dedicamos todo o nosso esforço e a nossa capacidade à área de tecnologia, para desenvolver sistemas de entregas nas residências dos consumidores. Abastecemos com segurança a sociedade brasileira. E o setor continuou investindo. Nos últimos três anos, investimos mais de R$ 50 bilhões em novas lojas no país.
Qual é a situação atual dos supermercados brasileiros e quais as perspectivas para este ano?
Continuamos crescendo. No ano passado, tivemos uma alta de 3,89% no consumo dos lares brasileiros em relação ao ano anterior, um resultado que não foi gerado apenas pelo esforço do setor em novas lojas e tecnologia. Foi um resultado alcançado também graças às políticas públicas durante aquele período. Tivemos o Auxílio Brasil de R$ 600, o pagamento do Auxílio Gás, a possibilidade de as pessoas sacarem o FGTS… Também tivemos auxílios para caminhoneiros e taxistas. Tudo isso contribuiu para o crescimento do consumo das famílias (alta de 1,07% em janeiro, na comparação com o mesmo período do ano passado). No primeiro bimestre de 2023, tivemos um crescimento de 1,44%. E continuamos agora com o apoio do novo governo às classes menos favorecidas, com o adicional de R$ 150 por criança para as famílias com crianças de até 6 anos. Isso também dá um suporte maior a essas pessoas, o que se reflete na alimentação.
O grupo francês Casino, controlador do Pão de Açúcar e do Assaí, enfrenta uma das maiores crises de sua história. O senhor teme o impacto dessa crise no mercado brasileiro?
Ali é uma questão dos controladores na França e não envolve a operação das empresas no Brasil. As companhias continuam bem operadas, estão muito bem. É uma questão pontual da organização e do controle. Hoje, o Assaí se tornou a primeira empresa de supermercados do país praticamente “sem dono”. A empresa está diluída na bolsa de valores entre inúmeros acionistas e continua sendo operada pelos mesmos dirigentes que estavam lá antes. Não há nenhum problema maior com essas empresas, mas com seus controladores.
Quais são suas expectativas sobre a reforma tributária?
Eu vou explicar a reforma tributária que está sendo proposta de uma forma muito simples, para que todos possam entender. De quanto seria o aumento na sardinha com a proposta que está sendo discutida, de um IVA de 25%? A sardinha teria um aumento de 18%. De quanto seria o aumento do azeite? 7%. De quanto seria o aumento nos ovos de Páscoa? O impacto seria ainda maior porque o ovo de Páscoa é composto de leite, de cacau, de açúcar… Todos esses itens teriam um aumento de, no mínimo, 18%. De quanto seria o aumento da batata? Sabe a batata, que acompanha o bacalhau? Teria um preço 25% maior. Se nós já estivéssemos nessa realidade da reforma tributária com o IVA que está sendo apresentado, certamente teríamos uma Páscoa ainda mais salgada nos preços.
A reforma tributária, nesses termos, é ruim para o país?
A primeira coisa que deveria ser feita é reduzir todo tipo de desperdício que se tem. Qual é o nosso maior problema hoje? Não estamos avaliando a eficiência do Estado brasileiro. Estamos discutindo um novo sistema tributário, mas ele virá com uma carga altíssima. E a distribuição dessa nova carga tributária vai impactar fortemente o comércio e os serviços, que são as duas áreas que mais empregam no país, além do agro, o setor que mais contribui com a balança comercial brasileira. Infelizmente, o projeto que vem sendo analisado vai aumentar a carga tributária, principalmente dos mais pobres.
A solução seria uma alíquota menor para o IVA? Ou manter os vários tributos que temos hoje?
Primeiramente, temos que fazer, em paralelo ao debate da reforma tributária, um debate sobre a eficiência do Estado. É aquilo que muitos chamam de reforma administrativa. O Estado não teria inúmeras possibilidades de redução de custos? Eu acho que tem. A reforma tributária, como está sendo proposta, com uma alíquota única, é totalmente inviável. Não dá nem para iniciar uma conversa falando em IVA de 25%. A regra que prevalece com sucesso no mundo é imposto único e alíquotas múltiplas, algumas reduzidas e outras majoradas, em função da essencialidade dos produtos.
E o novo arcabouço fiscal? O que o senhor achou da proposta?
No início, eu até tinha entendido que estávamos propondo uma nova regra fiscal justa. Se o país cresce, pode e deve gastar mais. Mas, para o país continuar crescendo, deve se trabalhar na questão do ambiente de negócios, para que todos possam investir com mais segurança e tranquilidade. Quando olhamos, de fato, o que está se propondo, é simplesmente o aumento da carga tributária. O fato é que vai haver um aumento da carga tributária para viabilizar o novo arcabouço fiscal. Quanto maior a tributação, mais a sociedade vai perder. De um lado, há todos os esforços para aumentar as receitas. De outro, uma tributação em cima de setores que empregam muito. Desse jeito, nós não vamos chegar a lugar nenhum.
Fonte: Metrópoles