Saca do grão já está 117% mais cara que no mesmo período do ano passado, e a tendência é de novos aumentos a partir de janeiro
O cafezinho do dia a dia dos brasileiros está ficando cada dia mais amargo para o bolso. O preço do grão disparou no mercado mundial por conta de problemas climáticos que causaram uma queda da produção em vários países, como o Brasil. O problema é que as quebras de safra vieram acompanhadas de um aumento da demanda mundial, principalmente devido ao maior apetite dos chineses pela bebida. O pior é que as estimativas são de mais aumentos no início de 2025.
O Brasil, que é o maior produtor mundial de café, deve produzir apenas 34,4 milhões de sacas do grão arábica na próxima temporada 2025-2026, contra 43,3 milhões de sacas na safra atual. Com isso, a produção global de café deve ficar aquém da demanda mundial em cerca de 8,5 milhões de sacas. Em apenas um ano, a cotação da saca de 60 quilos do café arábica já passou de R$ 988 para R$ 2.141, uma alta de quase 117%.
Houve uma queda da produtividade nos principais países produtores por causa de crises climáticas, que prejudicaram o desenvolvimento dos grãos no Brasil e Ásia. Isso fez com que os estoque da safra 2024-2025 caíssem e os preços subissem”, explica o mestre em Mercados Internacionais e coordenador do curso de Diplomacia Corporativa e Compliance da PUC Goiás, Apoena França. Ele acredita que o mercado pode voltar à normalidade somente na próxima safra, dependendo das condições climáticas, que afetaram o estoque, elevando os preços na Bolsa de Chicago.
No caso dos cafés especiais, o reajuste foi ainda maior, segundo o empresário Romero Fonseca, proprietário do Ópera Café. Ele lembra que, no último mês de julho, a saca de 60 quilos custava cerca de R$ 1,2 mil e, hoje, já é vendida por R$ 2,5 mil, mais que o dobro. “Com os seguidos aumentos, o café tradicional já está custando quase o mesmo valor dos especiais”, destaca.
Segundo Fonseca, a alta é resultado de quebras de safra em vários países, sendo que muitos até deixaram de produzir. Ele garante que repassou apenas 20% de aumento para seus cafés, desde que as altas começaram, em novembro de 2023, mas já avisa que precisará repassar mais 30% em janeiro para cobrir, pelo menos, parte da alta de custos.
O presidente da Associação Goiana de Supermercados (Agos), Sirlei Antônio do Couto, informa que, somente nos últimos 60 dias, houve um aumento no custo de aquisição do café para os supermercadistas de quase 50%. De acordo com ele, clientes já estão comprando menos café e as vendas caíram entre 20% e 25%. “Com preços mais altos nas gôndolas, muita gente que comprava pacotes de 500 gramas, hoje está levando o de 250 gramas”, destaca.
O presidente do Sindicato das Indústrias de Torrefação e Moagem de Café do Estado de Goiás (Sincafé), Jaques Silvério, lembra que, há dois anos, a saca de café verde custava cerca de R$ 700 e, atualmente, já chega a ser vendida por R$ 2,2 mil. “O café robusta, usado para fazer o blend, passou de R$ 400 para R$ 1,6 mil”, conta. Mas ele explica que, além dos problemas climáticos, que reduziram a produção no Brasil e em outros grandes produtores, como Vietnã e Colômbia, os preços também foram pressionados por uma alta do consumo.
Isso aconteceu, principalmente, na China. “Recentemente, os chineses compraram 4 milhões de sacas de café brasileiro, o que impactou muito a oferta. Sempre que a China entra em algum mercado, a pressão é muito grande”, ressalta o presidente do Sincafé. Ele conta que uma única empresa chinesa, a Luckin Coffee, que copiou o modelo de negócio da Starbucks, já abriu 20 mil cafeterias no país apenas nos últimos quatro anos, o que tem feito a demanda disparar. A forte alta no preço do grão verde resultou num aumento de 45% no preço do café moído e torrado. Mas Jaques Silvério alerta que os valores ainda não foram totalmente repassados e novos reajustes estão previstos para janeiro.
Anna Carolina Viana, vice-presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Café (Abic) e diretora executiva do Café Moinho Fino, lembra que a falta de produto no mercado mundial elevou a demanda pelo café brasileiro. Com isso, a produção local já não atende a demanda interna.
Ela adverte que a forte alta também está levando muitas grandes corretoras que negociaram café no mercado futuro a pedirem recuperação judicial por conta de dificuldade de entregarem o produto como preço atual. “Só saberemos como o mercado se comportará no próximo ano depois do período de exportações do grão e quando soubermos como será a próximo florada”, alerta.
Para Carolina Viana, hoje o preço está muito instável no mercado e a oferta do produto reduzida, pois quem ainda tem o grão está preferindo segurar à espera de preços ainda maiores, com a estimativa de uma próxima safra menor. Por isso, os preços podem subir mais. “Muitos atacadistas que fazem contratos com grandes redes supermercadistas não puderam repassar reajustes e estão no vermelho. Mas devem aumentar até 40% no vencimento destes contratos no início do ano”, adverte.
O empresário Diego Reis, da cafeteria Fiori Café, também afirma que os cafés especiais tiveram um reajuste maior e também alerta que mais aumentos devem ocorrer no início do próximo ano. A matéria-prima já subiu 25%, mas ele garante que ainda não repassou aos clientes. “Em janeiro, precisarei entrar com uma nova tabela com, pelo menos, 15% de aumento”, avisa. Com isso, o café expresso, que custa R$ 12 hoje, deve chegar aos R$ 14, e o capuccino deve subir de R$ 16 para R$ 18.
Fonte: Lucia Monteiro – O Popular