Em Destaque · 03 janeiro 2022

Presidente da Associação dos Supermercados de Mato Grosso do Sul afirma que modelo de negócio não atrapalha os pequenos mercados

Desde meados de 2017, os campo-grandenses assistem à expansão do comércio atacadista que também vende no varejo, os conhecidos atacarejos.

Na Capital existem três grandes redes, sendo que a mais antiga é o Atacadão, inclusive a loja da avenida Costa e Silva foi a primeira do modelo “cash & carry” (pagar e levar) implantada no Brasil.

De acordo com o economista Eugênio Pavão, a expansão desse tipo de comércio de fato é uma tendência em Campo Grande, pois, é uma forma rentável de atingir um público mais descentralizado, isto é, essa foi a forma encontrada por empresários do ramo para atender a demanda mais periférica sem perder lucro.

“A tendência é esse modelo de atacarejo pelos custos mais baixos e rentabilidade alta, sendo muito lucrativo especialmente neste momento, o que explica o montante de investimentos”.

Pavão ainda explica que o aumento dessas redes também é favorecido pelo atual momento de recessão econômica: os consumidores estão dando prioridade para comprar itens alimentícios e de higiene, o que é facilmente encontrado em supermercados.

Ainda a inflação faz com que as pessoas recorram a promoções e descontos, o que é frequente em redes de atacarejo, além de oferecer variedade de marcas e produtos em apenas um lugar, fazendo com que os gastos com locomoção também sejam reduzidos.

Entretanto, essa expansão não é apenas algo relacionado à situação econômica. Esse movimento também é uma estratégia de ocupação geográfica. Aqui a ideia é ocupar as periferias e descentralizar o comércio, atingindo públicos diversos.

“Hoje a tática é atingir grande parte da população com lojas menores e mais próximas de onde vivem os consumidores”, explica o economista.

Ele ainda cita um exemplo: “O Walmart [hipermercado que fechou sua loja em Campo Grande em 2019] foi um fracasso dos hipermercados, mostrando que o modelo de lojas gigantes e centralizadas não era adequado, pois os consumidores passaram a adotar os atacarejos”, pontua.

Essa mudança no setor acaba por mudar também a forma de consumo, já que as pessoas veem nos atacadistas formas de terem mais rendimento na hora de fazer as compras.

Segundo Eugênio, o que também pode explicar essa expansão é o modelo em si, que oferta grande quantidade de produtos de muitas marcas e vários tipos em um só lugar.

Por exemplo, no mesmo atacado pode-se encontrar itens para um almoço rápido ou uma receita mais elaborada, bem como produtos de limpeza para casa ou automóveis.

“Os produtos vendidos em supermercados são prioridade na vida das pessoas, que trocam outras despesas para comprar alimentos, higiene, etc. o que facilita para o consumidor que tem os atacadistas cada vez mais próximos de si”, aponta.

Apesar da alta inflação contribuir com esse crescimento, uma vez que clientes vão à esses lugares em busca de promoção ou até mesmo para não gastarem com condução indo a vários lugares para conseguir diferentes itens, Eugênio deixa claro que esse hábito nada tem a ver com a busca por fazer estoque como era na época da hiperinflação, quando o índice podia chegar a 1000% ao ano.

“A inflação no tempo do estoque tinha a renda como principal fator. Nossa inflação pode ser considerada ainda sob controle. Somente com hiperinflação teremos essa prática de volta”, explica.

Embora venha se mantendo com números positivos, chegará um momento em que esse “boom” irá cessar, pois, como esses comércios são instalados em bairros periféricos, chegará o momento em que as regiões para serem exploradas irão acabar, impedindo a continuidade da expansão.

Ainda de acordo com o economista, nos grandes centros o modelo de atacadista já está sendo substituído e por aqui o processo deve acontecer em médio prazo e levar cerca de cinco anos.

O que dizem os consumidores

Para muitos consumidores, o atacarejo representa a melhor opção de compras, seja pela diferença de preço ou pela quantidade que pode ser comprada de uma vez só.

Juliana Casadei, engenheira ambiental, mora na zona rural de Campo Grande, e conta que os atacadistas fazem parte da rotina de compras há muito tempo, uma vez que é possível comprar em grandes quantidades e fazer estoque, o que pra ela facilita por não precisar se deslocar várias vezes ao mercado.

“Fazemos sempre uma compra bem grande para passar um, às vezes, até dois meses em casa, além de alguns produtos básicos para fazenda, então, acaba sendo mais vantajoso”, explica

E completa: “Alguns itens são muito vantajosos, outros nem tanto. Mas no fim, para compras de muitas unidades de um mesmo item, sempre tem algum desconto. Então vale a pena para mim, além de facilitar.”

A economia, mesmo que de centavos, também é outro atrativo desse comércio, que oferece preços de atacado, geralmente, acima de três produtos iguais.

Fabiana Julião, de 27 anos, trabalha como assistente administrativa e vê nos atacadistas uma forma de economizar se comparado com o mercado tradicional.

“A diferença de preço de um supermercado é bem grande, chega a ser quase R$ 5,00 algum produto. Mas também há diferença entre os atacadistas”, pontua.

Fabiana ainda comenta que percebe uma oscilação de preço dependendo da data em que faz compras.

“Alguns atacadistas sobem demais o preço na primeira semana do mês e baixam nas últimas.”

Quem também sempre aproveita a oferta de itens variados em um só lugar é Angela Ferreira, de 24 anos. A professora de inglês relata que também sente a diferença entre atacadistas e supermercados convencionais na hora de passar as compras no caixa.

“Sinto que é mais barato na hora de pagar e que a quantidade de produtos no carrinho é maior que em outros mercados, então, fica aquela sensação de ‘é mais barato porque consigo levar mais coisas”, explica.

Entanto, ela explica que não abandonou de vez os supermercados de bairro por terem mais variedades em cortes de carne, mas quando procura por itens mais variados sempre recorre aos atacadistas

“Quando quero uma compra de outras coisas que não carne, eu vou nos atacadistas, inclusive fiz um cartão de crédito em um deles”, conclui.

Atacarejos x supermercados

Embora os atacarejos tenham se tornado populares, segundo Edmilson Verati, presidente da Associação dos Supermercados de Mato Grosso do Sul, afirma que isso não afeta as vendas em mercados tradicionais, pois, há partes na cidade em que não existem esse formato de atendimento e, teoricamente, não existe diferença de preço.

“Lucro cada rede tem o seu. Quando inaugura um novo comércio geralmente não se perde clientes, mas eles são redivididos. Sempre vai existir a concorrência.

Entretanto, ele assume que no começo do mês há diferença, pois o ato de consumo muda e alguns lugares tendem a perder clientes.

Contudo, o economista Eugênio Pavão diz que esse modelo acaba por interferir nos supermercados locais, que devem mudar a estratégia para enfrentar esse novo momento e podem chegar a reduzir a quantidade de estabelecimentos.

“Será interessante ver a convivência entre estas unidades e as redes locais e regionais. Se elas sobreviverão ou sucumbiram a esse modelo”, prevê.

Processo de expansão

Embora não divulguem dados sobre lucro ou crescimento, a rede Fort Atacadistas é uma das que mais cresceram nos últimos anos na Capital. Com oito lojas espalhadas pela cidade, possui um fluxo de clientes que em média chegam a 140 mil em cada unidade durante um único dia.

O crescimento é tão notável que mesmo diante de uma recessão econômica e a pandemia de Covid-19, a rede inaugurou mais uma loja, em novembro de 2021.

Outra rede de atacarejo que está em expansão é o Assaí, que até o final do ano irá abrir mais lojas em alguns locais onde antes eram os Hipermercados Extra. Em Campo Grande, ainda não é certo se as duas unidades vão tornar-se o atacadista ou se terão outra destinação. Além de Campo Grande, o Assaí também está presente em Dourados, interior de MS.

Fonte: Correio do Estado