Em Destaque · 22 novembro 2024

Alta do valor de itens tradicionais é atribuída a aumento da demanda no fim de ano, questões climáticas e elevação do dólar

As próximas festas de fim de ano devem ser mais impactadas pela inflação dos alimentos. Vários ingredientes de pratos mais tradicionais da ceia de Natal estão bem mais caros. É o caso de carnes, azeites, frutas natalinas e sucos, que, além do incremento da demanda sazonal, estão com preços mais altos por conta de problemas climáticos e da maior cotação do dólar. Comerciantes garantem que reduziram margens para manter bons patamares de venda.

Uma prévia do Índice de Preços ao Consumidor (IPC) da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe) revelou que os itens da cesta de Natal ficaram, em média, 9,16% mais caros em 2024, o dobro da inflação do período. O coordenador do IPC da Fipe, Guilherme Moreira, lembra que, além dos itens que normalmente já sobem nesta época de forma sazonal, como o pernil, o grande destaque deste ano é o forte aumento das carnes em geral, que pesam muito para o consumidor.

Para ele, os preços mais altos são resultado da combinação de três fatores: problemas climáticos, aumento da demanda natural no período e câmbio favorável à exportação, que encarece os produtos aqui.

“O churrasco de fim de ano é tradição do brasileiro e os preços já sobem nesta época. Mas, neste ano, também tivemos secas muito severas e queimadas, que afetaram a produtividade e elevaram o custo de produção no campo”, ressalta.

Problemas climáticos que reduziram a produção mundial e a taxa de câmbio impactaram fortemente o custo do azeite. “Esta mesma taxa de câmbio elevada também deixou nossos produtos mais atrativos lá fora e as exportações de carne passaram a competir com o mercado interno”, lembra Moreira. Para ele, é normal estes preços subirem no fim do ano, mas não deste jeito.

Uma saída para muita gente é trocar itens por outros. “Na Páscoa, já vivemos isso como bacalhau e o azeite. Se não cabe no orçamento, o consumidor faz ajustes. O fato é que teremos um Natal inflacionado”, diz.

Para Tárik Mikael, proprietário do Empório Sírio Libanês, uma das pressões vieram do dólar mais alto, que impactou os preços dos vinhos em cerca de 10% a 12%. Já o azeite também está muito mais caro por causa da escassez do produto no mercado mundial, depois de problemas de safra no ano passado. Frutas secas, no geral subiram de 7% a 10%. Já o bacalhau, que já havia subido de 7% a 8% no início do ano, hoje tem preço estável.


“Para amenizar o impacto dos aumentos, reduzimos as margens, junto com as importadoras, o que resultou em menores índices para o consumidor final”, garante Mikael. Mas ele acredita que muitos produtos tiveram altas abaixo do esperado. “O panetone, um produto sazonal e que tem diferença de um ano para outro, teve apenas de 6% a 7% de aumento”, destaca.

Mesmo com as altas, panetones importados, cuja caixa chega a custar até R$ 250, continuam muito procurados. “Temos clientes fiéis a estes produtos diferenciados. Alguns sempre mandam reservar quando esta época se aproxima. O Natal é sempre bom para as vendas, pois todo mundo faz questão de comemorar de alguma forma”, afirma o empresário.

O proprietário do Empório Pequiras, Frederico da Costa Batista, confirma que alguns itens subiram muito neste ano, como os azeites e vinhos, além de biscoitos e chocolates. Mas o grande destaque foram os reajustes das carnes, que ficaram 50% mais caras. O preço do bacalhau também subiu entre 15% e 20% ao longo do ano. “Temos impactos vindos do dólar sobre os importados, de problemas climáticos e até altas de impostos. Tentamos trabalhar com itens bem avaliados, com melhor custo-benefício”, garante.

Os preços dos itens importados subiram de 15% a 20% sobre o ano passado e Batista garante que chegou a sacrificar um pouco suas margens de lucro e trocou itens que tiveram aumentos maiores para amenizar um pouco o impacto para o consumidor. “A cesta básica de forma geral subiu. A ceia de Natal neste ano estará, pelo menos, 20% mais cara”, prevê. O empresário dá o exemplo do azeite, que custava menos de R$ 40 e, hoje, é vendido por até R$ 60.

Mas ele garante que os clientes entendem os motivos dos reajustes. Aqueles que montam cestas e kits de Natal para presentear parentes, amigos ou clientes reclamaram de aumentos, mas acabam trocando alguns itens por outros mais baratos.

“Para atender bem o cliente, sacrificamos margens, mas estamos confiantes nas vendas das cestas, que crescem de 10% a 15% de um ano para outro. No ano passado o crescimento foi de 20%. Neste ano, deve ser um pouco menos”, prevê.

ANTECIPAÇÃO

Os chefs de cozinha que produzem ceias de Natal por encomenda também já estão sentindo o impacto de tantas altas nos preços dos ingredientes. O professor de gastronomia e chef Pedro Ernesto acredita que terá uma margem menor de lucro neste ano. “Já fiz o cardápio com os preços e não posso mais voltar atrás. Não consegui repassar os aumentos e precisarei ganhar no volume”, informa. Para ele, o que mais assusta é o preço do filé mignon, que passou de R$ 40 para cerca de R$70.

“E o pior é que alguns produtos ainda estão em falta. Meu fornecedor de frango já limitou os pedidos. Pedi cinco caixas e ele mandou três. Tive de comprar em outro lugar para completar”, conta o chef. Os fornecedores estariam culpando os problemas climáticos, como as chuvas, pela falta do produto. Antes, o preço só aumentava no final de novembro e início de dezembro. Neste ano, as altas começaram no final de outubro.

Mas Pedro Ernesto ressalta que produtos básicos, como leite, arroz e feijão, estão mais caros. “Agora, azeite virou até presente de Natal ou de amigo secreto”, brinca. Uma das estratégias será limitar os pedidos de pratos com filé mignon à disponibilidade do estoque atual. Neste ano, os clientes estão adiantando os pedidos. “Já tinha encomendas antes de soltar o cardápio. Em 2023, eu só tinha 2 pedidos nesta época. Hoje, já tenho 12. Sempre faço um pouco mais para atender quem deixa para última hora. Mas, neste ano, não conseguirei fazer isso”, avisa o chef, que prevê um aumento de 30% nos pedidos.

Para o presidente da Associação Goiana de Supermercados (Agos), Sirlei do Couto, o maior impacto sobre o custo da ceia de Natal deve mesmo vir dos preços das carnes bovina e suína, que subiram 50% e 42%, respectivamente. Produtos como cerveja, sucos, vinhos e espumantes também estão pesando mais. “Já o panetone subiu apenas 5%, o que é um aumento normal por conta da inflação e dos aumentos de salários”, destaca. Mas, como no Natal as pessoas não abrem mão de uma ceia, o consumidor de menor renda acaba optando por carnes mais baratas, como o frango. “Os preços estão oscilando e muita coisa pode mudar até o Natal, inclusive até com baixas”, prevê.


O supermercadista Gilberto Soares informa que produtos como chester, peru e ave master tiveram cerca de 12% de aumento. Segundo ele, o frango também começou a subir por causa da disparada do dólar, que afetou os preços das rações, e os suínos estão até 15% mais caros. As frutas também estão mais caras, como a maçã gala, que foi impactada pela alta do dólar.

“Mas a produção nacional vai chegar agora e deve reduzir um pouco os preços. A caixa da uva nacional também está mais barata. O panetone praticamente não subiu”, diz Soares. Ele também acredita que muitos preços podem mudar até dezembro. “O brasileiro não deixa de confraternizar. O consumo de carne continua, mesmo com a forte alta, e aumenta a venda de frangos, cortes e ovos”.

Fonte: Por Lucia Monteiro, O Popular