Especialistas alertam para importância de assegurar, na regulamentação, que a alíquota zero sobre itens básicos beneficie o consumidor
O real impacto que a desoneração da cesta básica, prevista no texto da reforma tributária aprovado na Câmara dos Deputados, terá sobre os preços dos produtos que fizerem parte dela ainda dependerá da lei complementar que fará sua regulamentação.
Tributaristas acreditam que os parlamentares deverão ter muito bom senso para definir as regras de operacionalização para que esta desoneração realmente chegue ao preço final dos produtos, e não seja incorporada ao lucro das empresas ao longo das cadeias produtivas.
Para o advogado tributarista Gilberto Scislewski, do escritório Jacó Coelho Advogados, há uma grande expectativa pela desoneração dos produtos da cesta básica. Ele observa que a lei complementar para definir quais produtos farão parte dessa cesta e terão alíquota zero também pode indicar outros que podem ter alíquota escalonada. A estimativa é que os produtos mais beneficiados sejam industrializados, por estarem numa cadeia produtiva maior até o consumidor.
Mas o tributarista alerta que, por enquanto, só existem perspectivas e o impacto final ainda é desconhecido. Segundo ele, o “bom senso” do governo é de que o aproveitamento de créditos tributários destes produtos se reverta em descontos nos preços ao consumidor. “Mas é uma grande ingenuidade achar que tudo será repassado em forma de descontos, pois a história mostra que boa parte do benefício acaba incorporado aos lucros das empresas”, alerta.
Apesar da expectativa de que a desoneração resulte em queda nos preços dos produtos da cesta básica, outros pontos da reforma ainda podem onerar os preços. Gilberto Scislewski lembra, apesar da futura alíquota zero, que os preços destes produtos ainda podem ser impactados pela tributação do setor de serviços, por exemplo, que deve ser muito elevada pelo formato atual da reforma. “Toda empresa que produz algo utiliza vários tipos de serviços e isso vai acabar impactando a cesta básica em algum momento. Alguém terá de pagar esta conta e será o consumidor final”, prevê.
Por isso, o tributarista acredita que esta tributação sobre o setor de serviços terá de ser repensada no Senado, pois os custos da cesta básica devem ser analisados em conjunto com os serviços utilizados para fabricação de seus produtos. Ele avalia que ainda exista muita especulação, pois tudo ainda dependerá da lei complementar. “Já existem previsões de queda de até 70% nos preços de alguns produtos, mas somente com a desoneração não é possível ter uma redução desta ordem”, adverte
Para o também advogado tributarista Sidnei Pimentel, a política tributária do Estado de Goiás, que tem ICMS diferenciado de 7% para produtos da cesta básica, além de incentivar toda cadeia de alimentos, já é muito interessante. “Acredito que a cesta básica deve ter uma tributação diferenciada, independente do poder aquisitivo de quem consome”, diz.
Apesar da reforma caminhar para no sentido da justiça tributária, Sidnei também acredita que tudo ainda dependerá do formato da lei complementar. “Quais serão os critérios para elaboração desta cesta básica? Serão os produtos definidos pelo Dieese ou será criada uma nova lista?”, questiona Pimentel.
Além disso, o ideal é que o consumidor já compre o produto livre de impostos, e não receba um cashback pelos tributos que ele já pagou, o que seria bem mais difícil operacionalmente. “Uma das vantagens é que isso vai incentivar o consumidor a pedir a nota fiscal”, reconhece.
Corrigir distorções
A maior preocupação atual é com a garantia de que a desoneração realmente se reflita nos preços, ou seja, se o fato de um produto ter sido desonerado, pura e simplesmente, se refletirá no valor final cobrado do consumidor. “Se o mercado funcionar normalmente, o preço dos produtos da cesta básica terá de refletir a exclusão destes 7% de ICMS, já cobrados no caso da tributação de Goiás. Mas o sistema de aproveitamento de créditos ainda dever ser detalhado pela lei complementar”, avalia.
Por isso, o tributarista acredita que o governo deverá adotar mecanismos para corrigir distorções do mercado, que também precisará funcionar bem para que a reforma alcance seu objetivo. “A reforma tributária é um falso consenso, pois todos os segmentos querem pagar menos e o governo quer arrecadar mais. Por isso, a formatação da lei complementar será um grande desafio”, alerta
Fonte: O Popular