Em Destaque · 05 abril 2022

Em um cenário como o atual, com concorrência acirrada, disputa de talentos e economia instável, quanto mais diverso for o time, mais fácil será para chegar aos resultados esperados

Falar de diversidade, é falar de negócios, de resultados, de perenidade. Um estudo feito pela McKinsey mostra que quanto mais diverso for o time, mais fácil chegar aos resultados esperados. Realizado com quase quatro mil empresas, a pesquisa destaca a conexão da diversidade com práticas de negócios positivas, comportamentos eficazes de liderança, saúde organizacional e performance do negócio. De acordo com a pesquisa, funcionários de empresas que apostam na diversidade relatam níveis mais altos de colaboração e inovação e têm probabilidade 152% maior de propor ideias e tentar formas diferentes de realizar as atividades. As companhias com maior diversidade de gênero, por exemplo, têm 21% mais chances de apresentar resultados acima da média do mercado. No caso da diversidade cultural e étnica, esse número sobe para 33%.

Não à toa, um levantamento da PwC mostra que 76% das companhias estão investindo em programas de diversidade. Porém, para que isso aconteça, as organizações ainda precisam avançar no desenho e na execução de programas de diversidade e inclusão.  De acordo com a PwC, apenas 5% das organizações estão tendo sucesso nas principais dimensões de um programa de diversidade e inclusão bem-sucedido. É preciso entender, por exemplo, que não basta apenas criar ações pontuais de recrutamento e seleção, é preciso trabalhar na conscientização de todo o time, principalmente da liderança. O estudo da PwC aponta que o baixo índice de sucesso nesses programas tem a ver com um desalinhamento entre as ações das companhias e as percepções dos funcionários, o que está diretamente ligado à atuação dos líderes: mais de 79% dos líderes são pouco engajados no tema e apenas 26% das empresas criam metas de diversidade para os gestores.

Por onde começar

O primeiro passo para iniciar um programa de diversidade é entender o quadro de funcionários atual da empresa. “A recomendação é realizar um censo para compreender o pertencimento dos colaboradores e suas representatividades no ambiente organizacional”, explica Laura Salles, co-fundadora da Plurie br.  Com o mapeamento do time em mãos, a empresa pode começar a desenhar o programa, que deve contar com educação e formação de aliados da diversidade – do atendimento ao CEO da empresa.

Para isso, há três pilares que precisam ser observados, como explica Amanda Aragão, consultora sênior e head da curadoria de talentos da Mais Diversidade. O primeiro é a governança, às instâncias de decisão relacionadas ao programa. “Para isso, é importante que a alta liderança esteja disposta a apoiar a ação institucionalmente, que haja um Comitê de Diversidade e grupos de afinidade temáticos”, explica. O segundo é a estratégia. Amanda explica que é essencial que o programa tenha alinhamento com os desafios do negócio e de sua demografia. “Por fim, é preciso desdobrar a estratégia em um plano de ação, com indicadores claros, definindo responsáveis para cada uma das frentes”, diz. Tudo isso com continuidade e recorrência.

Uma jornada contínua

O Grupo Carrefour Brasil, que há dez anos possui uma plataforma de diversidade e inclusão, tem trabalhado com esses pilares. Por lá, o tema é estratégico e tratado como um caminho que não tem fim. Ou seja, a empresa sempre pensa em novas ações para atender aos objetivos traçados: equidade de oportunidades, cultura do respeito, diálogo com todos os stakeholders e diversidade como valor da marca. Kaleb Machado, gerente de diversidade e inclusão do Carrefour, costuma falar que diversidade é um músculo que precisa ser exercitado diariamente. “Todo dia reforço com meus colaboradores os conceitos, além do que se espera deles, quais são as condutas de respeito, e o que é comunicação não-violenta e empatia, pois temos de trabalhar diariamente nossos vieses inconscientes”, diz.

Entre as ações da empresa estão os programas de desenvolvimento para grupos minorizados (LGBT, mulheres, pessoas negras e pessoas com deficiências). Um deles é o IDE, que remete, inclusive, ao verbo ir, ‘eu posso estar aonde eu quiser’, e de inclusão, diversidade e equidade. Trata-se de um trabalho de formação e capacitação para o mercado de trabalho. Nele, há módulos que tratam de soft skills, síndrome do impostor e da heroína e autossabotagem. Há, ainda, treinamentos de skills técnicas, como inovação e excel.

Um bom exemplo são os projetos voltados para o público trans que, desde 2016, já formaram mais de 250 pessoas. Em 2021, o programa TRANSforma, realizado em parceria com a Alicerce Educação e a Casa Neon, selecionou 40 pessoas para passarem por um processo de formação de seis meses que busca capacitá-las tanto em aspectos técnicos quanto em competências socioemocionais. Mas, segundo Kaleb, não basta apenas trazê-las para a empresa, é preciso trabalhar na conscientização do time e no senso de pertencimento. “Cuidamos para que essa inclusão aconteça de fato, com ações como usar o banheiro com o qual se identifica em termos de gênero e adequação em nosso sistema para o nome social que vai no crachá”, diz.  Hoje, a empresa tem mais de 160 pessoas trans trabalhando na rede.

Sue Ellen Pereira, colaboradora de uma unidade do Carrefour em São Paulo, é uma delas. Há cinco anos na empresa, ela viu sua vida mudar com a oportunidade de ingressar na companhia. “O mercado de trabalho para pessoas trans é muito difícil. Antes dessa vaga, eu não tinha muitas perspectivas, não podia sonhar. Infelizmente, a maioria vai para o lado obscuro da vida e acaba fazendo qualquer coisa para pagar as contas”, diz. Dos trabalhos que ela teve anteriormente, como auxiliar de cozinha e manicure, nenhum era de carteira assinada. “Costumo falar que tive a oportunidade de ser cidadã mesmo – de poder sonhar. Coisas que podem ser simples para muitas pessoas, como ter um holerite e conseguir viajar são desejos realizados com o trabalho”, diz. 

Capacitar para incluir

A Cencosud Brasil é outra rede que aposta na diversidade. “Aqui, acreditamos que contar com diversas equipes de trabalho, que sejam um reflexo das sociedades nas quais estamos inseridos, nos permite entender melhor os nossos clientes, e assim, responder da melhor forma às suas necessidades e demandas”, diz Jacqueline Fontes, diretora de RH da empresa. Ela explica, inclusive, que a questão de diversidade e inclusão está embasada em um dos pilares do manifesto da companhia: “Atuamos em vários cantos, com diferentes rostos e sotaques”.

Uma das iniciativas é o programa para a contratação de PCDs. Para tornar o processo seletivo mais equilibrado, a empresa adotou um sistema de entrevistas de emprego na Língua Brasileira de Sinais (Libras), e conta com o apoio de instituições parceiras para realizar entrevistas, visando a melhor experiência dos candidatos. Além disso, por meio do Campus Cencosud, plataforma e-learning de capacitação da companhia, todos os colaboradores têm à disposição um curso de Libras, com o objetivo de facilitar o contato com pessoas com deficiência auditiva, tanto as que trabalham na empresa, quanto os clientes que frequentam as lojas. “Ações como essa tornam nossa política de diversidade e inclusão mais sustentável a curto e longo prazos. Essa é uma das formas de torná-la uma realidade, não apenas uma declaração e uma diretriz empresarial.”, diz.

Entre os 1200 funcionários PCDs da companhia está Raquel Bonfim, que há três anos trabalha como atendente de frente de loja no supermercado Prezunic na Barra da Tijuca (RJ). Com deficiência física adquirida aos 24 anos após um acidente, ela perdeu parcialmente os movimentos de um dos pés. “Depois que sofri o acidente, muitas pessoas passaram a me olhar de outra forma. No início, foi difícil aceitar essa condição. Mas, com o tempo, decidi seguir em frente e não me preocupar com isso, caso contrário, eu mesmo estaria criando barreiras para o meu crescimento”, diz.  Segundo ela, a entrada na empresa foi um pontapé para seu crescimento profissional. “Aqui tenho oportunidade de crescer. Estou participando, por exemplo, de um treinamento para cartazista, e tenho certeza de que só depende de mim crescer profissionalmente e, futuramente, me habilitar para esse novo cargo”, afirma. 

Liderança feminina

Em celebração ao Dia Internacional da Mulher, comemorado no dia 8 de março, a Rede São Vicente anunciou que pretende ampliar a participação das mulheres em posições de liderança para 50% até 2024. Atualmente, depois de uma elevação de 15% no quadro de liderança feminina em 2021, este contingente está em 39%. 

Uma dessas mulheres líderes é Fátima Luz Lima, coordenadora de abastecimento há dois anos — uma área em que costumeiramente é preenchida por homens. “Conheci muitas pessoas que colaboraram nessa trajetória. Estar no cargo de gestão é desafiador, pois todo momento precisamos provar do que somos capazes. Muitas vezes não fui considerada para cargos de gestão por ser muito boa na parte técnica, mas com muita paciência e perseverança tinha certeza que meu momento chegaria”, comentou.  

O compromisso do São Vicente com seu quadro feminino também inclui ampliar a participação em áreas ou assuntos pouco usuais para as mulheres no ambiente de trabalho, como Tecnologia, por exemplo. Para isso, a empresa está investindo em treinamentos específicos para o público feminino estimulando a participação que não era tão usual. “Para que as oportunidades sejam realmente iguais, precisamos criar um ambiente favorável, onde possamos incentivar e apoiar novas escolhas e ambientes diversos”, afirma Luciana Bueno, Gerente de Gente & ESG.

Metas claras impulsionam a diversidade

Em maio, a Mars Brasil assumiu o compromisso público de aumentar a representação de negros nos cargos de liderança da empresa para 30% até 2030, além de ter 100% de equilíbrio de gênero entre as equipes de liderança. “Nos últimos anos, fizemos um bom progresso na representação de gênero, aumentando a proporção de mulheres em cargos de liderança sênior em mais de um terço. No Brasil, temos 40% de mulheres como líderes de equipe – o que chamamos de “Line Managers”, que se baseiam na função de coordenação –, e alcançamos 30% de mulheres líderes em cargos gerenciais”, conta Marcele Gianmarino, gerente de diversidade e inclusão da Mars.

Para chegar aos números atuais e alcançar a meta, a Mars ouviu as mulheres para entender como fortalecer as mensagens de diversidade feminina dentro da companhia e, assim, dar mais suporte àquelas que estão retornando de licença maternidade, por exemplo. Além disso, foi criado um grupo de afinidade de gênero para propiciar um local seguro, no qual as mulheres possam trazer suas experiências e serem acolhidas. “Isso nos ajuda a alcançar nossos objetivos de prover representação igualitária e equilibrada para mulheres do mundo todo”, diz Marcele.

Em 2021, como parte desse trabalho, a empresa finalizou o relatório #HereToBeHeard, no qual fez uma pergunta às mulheres: o que precisa mudar para que mais mulheres possam alcançar seu máximo potencial? Em três meses, mais de 10 mil mulheres de 88 países responderam. O material fornece recomendações práticas para quebrar as barreiras que impedem as mulheres de alcançar todo o seu potencial para moldar um ambiente de negócios mais inclusivo. Os dados estão sendo usados, inclusive, para gerar os próximos passos da empresa, moldar as prioridades e orientar os investimentos.

Olhar o público externo é essencial

Mas o setor de varejo apresenta uma grande complexidade a mais quando falamos de diversidade e inclusão, pois não é possível tratar deste tema apenas a partir da perspectiva interna. “É preciso envolver toda a cadeia de valor do negócio. Esse aspecto traz desafios adicionais, como qualificar fornecedores em relação ao tema, posicionar-se na relação com clientes, além de buscar melhorias estruturais em políticas e processos corporativos”, explica Amanda, da Mais Diversidade.

A P&G, companhia que atende quase 5 bilhões de pessoas ao redor do mundo com suas marcas, sabe bem da força de seu discurso e da importância de dar o exemplo. Para promover a diversidade, principalmente de gênero, etnia, PcD e LGBTQI+, intensificou os esforços no tema e, nos últimos anos, fez mudanças na comunicação das marcas e revisitou as políticas internas de inclusão. Entre as ações estão #PrideSkill, que tem como objetivo facilitar a busca por profissionais LGBTI+, os encorajando a incluírem “Pride” como uma competência em seu perfil profissional no LinkedIn; o Projeto Racial 360°, que promove ações de diversidade e inclusão étnico-racial dentro e fora da companhia; e Always pelo Fim da Pobreza Menstrual, que tem o intuito de abrir espaço para a discussão sobre pobreza menstrual no Brasil e contribuir junto com a sociedade para dar a todas as pessoas que menstruam a oportunidade de ter um futuro melhor. No Projeto Racial 360°, por exemplo, há ações como treinamento e desenvolvimento para chegar a 55% de recrutamento com diversidade racial até 2022 e mudanças na forma de fazer publicidade para incentivar conversas importantes e com representatividade, lançando campanhas inclusivas e ativando embaixadores como a Liniker, Camilla de Lucas e Babu Santana.

Mas Laura Vicentini, vice-presidente das marcas de cuidados femininos e bebês da P&G Brasil e líder do pilar de equidade e inclusão da companhia no Brasil, reforça que diversidade, igualdade e inclusão não podem ser um esforço tático e superficial. “Faz parte do porquê e como fazemos nosso negócio, e devem ser algo intencional, estratégico e articulado como qualquer outra medida de negócio”, explica Laura.

A promoção da diversidade em sete passos

Boas práticas para a implantação de programas de diversidade e inclusão (D&I)

1. Faça um bom diagnóstico inicial. Entenda o seu momento, de onde vem a demanda para implantação do tema e mapeie seus sponsors. Considere a visão e o planejamento estratégico da empresa e como D&I está ancorado nela. Considere a realização de um censo de diversidade.

2. Faça a sensibilização da alta gestão e dos demais funcionários. Trabalhar vieses inconscientes pode ser um bom começo. Avalie a necessidade de transformação em sua cultura organizacional.

3. Estimule grupos de afinidades e busque aliados para os pilares escolhidos como foco.

4. Reveja suas políticas e processos de RH criando um pipeline que dará sustentação às mudanças desejadas.

5. Promova o desenvolvimento do público de seu pilar-alvo sem esquecer de envolver sempre a liderança nesta jornada.

6. Mensure resultados e comunique sempre os resultados alcançados reconhecendo pessoas e áreas de destaque. Analise, critique e repense sempre. Tudo está mudando muito rápido.

7. Busque e compartilhe sempre conhecimento de qualidade. Esteja antenado no mundo e na sua realidade.

Fonte: Consultoria LHH Brasil.

A conta fecha

Veja alguns benefícios de contar com políticas de diversidade 

– 67% dos candidatos querem ingressar em uma equipe diversificada;
– 70% mais chances de conquistar novos mercados.

– Fluxo de caixa 2,3 vezes maior;

– 1,7 vezes mais chances de ser líder em inovação no seu mercado.
Fontes: Glassdoor, McKinsey e Harvard Business Review

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Fonte: SuperHiper