Se o consumidor acredita que os preços vão subir amanhã, ele compra tudo o que pode hoje. Mas o aumento da procura por um produto gera aumento de preço, mais inflação, e o Brasil é especialista nesse assunto
Um fenômeno comum na economia brasileira encontra explicações na psicologia. É o mecanismo do comportamento humano que faz com que a inflação acabe alimentando mais inflação.
Um olhar atento pelos corredores dos supermercados nota que estamos mudados pela inflação.
“Em períodos como esse, você vende muito mais produtos de baixo valor agregado. Produtos de primeiro preço, que é uma forma do cliente também defender a sua renda, para que o seu salário continue com o poder de renda que tinha antes. Então, ele leva um volume maior e de produtos mais baratos”, explica Luiz Carlos Araújo, diretor regional do Assaí.
Pode parecer contraditório encher o carrinho de compras inconformada com os preços.
“Cada dia mais os preços estão um absurdo. Arroz, feijão, óleo, que é o que mais sobe hoje em dia. Coisa de limpeza, sabão em pó…”, diz a consumidora Valdeci dos Santos.
Já começamos o ano com a herança de uma inflação de dois dígitos, e esse sentimento de incerteza diante da prateleira é um fator a mais de pressão sobre os preços.
“Você tem um choque de ofertas. E você tem essa aceleração das decisões de compra para você tentar, digamos, se proteger um pouco dessa inflação. Tudo isso contribui para esse efeito manada”, diz Sérgio Almeida, professor de economia comportamental da USP.
É quando a psicologia explica a economia. Além do custo de produção, de frete, de matérias primas, está somada na etiqueta de preço a expectativa de inflação. Ou seja, se o consumidor acredita que os preços vão subir amanhã, ele compra tudo o que pode hoje. Acontece que o aumento da procura por um produto gera de fato um aumento de preço, mais inflação, e o Brasil é especialista nesse assunto.
Foram economistas brasileiros que nos anos 1980, de hiperinflação, incluíram nos livros o conceito de inflação inercia
“É um processo contínuo. Os preços de hoje refletem a inflação de ontem e os de amanhã vão refletir os preços de hoje. E, nesse processo, o combate à inflação fica muito difícil, porque a inflação só sobe. Eu diria que já existe um certo nível de inflação inercial nesse momento no Brasil devido a um aumento muito forte da inflação. Hoje, felizmente, se combate isso com os instrumentos conhecidos, os instrumentos clássicos, que são a combinação de política fiscal – isso é, controle dos gastos públicos – e política monetária. Isso é o uso do instrumento básico do Banco Central que é a taxa de juro”, explica Maílson de Nóbrega, ex-ministro da Fazenda.
Economistas revisam para cima as projeções de inflação, quando esperam alta de preços. E o consumidor faz o quê?
“A gente junta uma reservinha e vai lá e compra um pouco mais de arroz, de feijão, de tudo para manter a casa, não deixar faltar. Porque a gente não sabe o dia de amanhã. Está complicada a situação”, diz o comerciante Reinaldo Souza dos Santos.
Fonte: G1